AULA 04

OS FILÓSOFOS PRÉ-SOCRÁTICOS

Os filósofos pré-socráticos tiveram seu interesse filosófico voltado para a natureza (phýsis), assim sendo, os primeiros filósofos eram investigadores da natureza, ou phýsicos. O termo pré-socrático pode ser considerado somente como um ‘padrão’ filosófico, já que nada tem de cronológico ou qualitativo. Sócrates, em verdade, teve como contemporâneos vários filósofos qualificados como pré-socráticos. Essa denominação deve-se ao fato de que a partir dele o interesse pela natureza é integrado ao interesse pelo espírito.
A filosofia, ao nascer, teve definida a sua busca: uma explicação racional sobre a origem e ordem do mundo, o kósmos (cosmos). Por tal motivo os primórdios da filosofia grega são considerados de caráter cosmológico. Os primeiros filósofos se ocuparam principalmente de indagações a respeito do mundo ao seu redor, que também envolviam a percepção do lugar do homem nele. Essa busca trouxe à luz uma divergência entre a ciência e o senso comum.
Conforme Reale (1993), antes do nascimento da filosofia os educadores dos gregos foram os poetas, principalmente Homero. Nos poemas homéricos, estes buscaram alimento espiritual e extraíram “modelos de vida, matéria de reflexão, estímulo à fantasia e, portanto todos os elementos essenciais à própria educação e formação espiritual”. Neste sentido:

Pode-se dizer que, para o homem homérico e para o homem grego filho da tradição homérica, tudo é divino, no sentido de que tudo o que acontece é obra dos deuses. Todos os fenômenos naturais são promovidos por numes: os trovões e os raios são lançados por Zeus do alto do Olimpo, as ondas do mar são levantadas pelo tridente de Posseidon, o sol é carregado pelo áureo carro de Apolo, e assim por diante (REALE, 1993, p. 21).

Até então, o homem tinha como herança cultural a crença de que tudo - desde as quatro estações até a morte - era relacionado a um deus ou um mito. Surge então uma nova mentalidade, que passa a substituir as antigas construções mitológicas pela forma intelectual, expressa por meio de especulação livre sobre a natureza do mundo e as finalidades da vida. Neste espírito houve o desenvolvimento da matemática, da ciência e da filosofia. O primeiro a levantar essas questões foi Tales de Mileto.
A grandeza desses primeiros filósofos está no fato, não de com eles ter começado a filosofia, mas por terem “formulado questões, problemas e condições da ciência e da filosofia, que permanecem significativas até hoje” (OLIVA; GUERREIRO, 2000, p.10).
Os historiadores costumam distinguir no período pré-socrático quatro grandes tendências ou escolas, em geral coexistentes: Escola Jônica; Escola Pitagórica ou Itálica; Escola Eleata; e, Escola Atomista.
É habitual considerar a Escola Jônica como a iniciadora da reflexão filosófica na Grécia. Mas, de Tales, de Anaximandro, ou de Anaxímenes não restou diretamente qualquer texto. Esta corrente filosófica considera o homem, mas o vê somente como uma parte ou um elemento da natureza, não como o centro de um problema específico.
Diferentemente dos poetas, os jônios foram à procura de “um substrato imutável, imanente às coisas mutáveis, capaz de despontar como fundamento último de tudo quanto existe e de dar conta da espantosa diversidade dos fenômenos” (OLIVA; GUERREIRO, 2000, p. 32). Estes tinham como objetivo principal descobrir qual a única substância que constitui o ser. Conforme Abbagnano, esta é para os pré-socráticos “a matéria de que todas as coisas se compõem; mas é também a força que explica a sua composição, o seu nascimento, a sua morte, e a sua perpétua mudança” (ABBAGNANO, 1999, p. 27).
Os Jônios foram os primeiros a se questionar sobre o que seria a arché (princípio, origem) das coisas.

A importância da noção de arché está exatamente na tentativa por parte desses filósofos de apresentar uma explicação da realidade em um sentido mais profundo, estabelecendo um princípio básico que permeie toda a realidade, que de certa forma a unifique, e que ao mesmo tempo seja um elemento natural. Tal princípio daria precisamente o caráter geral a esse tipo de explicação, permitindo considerá-la como inaugurando a ciência (MARCONDES, 2004, p.26)

Uma característica da Escola Jônica é fundamental nesse sentido: o modo de explicar a realidade natural a partir dela mesma, sem nenhuma referência ao sobrenatural ou misterioso. Assim, podemos perceber que o objetivo desses primeiro filósofos era construir uma cosmologia (explicação racional e sistemática das características do universo) que substituísse a antiga cosmogonia (explicação sobre a origem do universo baseada nos mitos).



ABBAGNANO, Nicola. História da Filosofia. 6. ed. Lisboa: Editorial Presença, 1999.
MARCONDES, Danilo. Iniciação à História da Filosofia: dos pré-socráticos a Wittgenstein. 8. ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2004.
OLIVA, Alberto; GUERREIRO, Mario. Pré-socráticos: a invenção da filosofia. Campinas: Papirus, 2000.
REALE, Giovanni. História da filosofia antiga. São Paulo: Loyola, 1993. 1v.